segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Inconstância Pragmática

      
      Alienação, controle da mídia e submissão ideológica já se tornaram parte do vocabulário usual de textos encontrados na internet, mas frente às inúmeras crises (econômicas, culturais, políticas, e etc) da atualidade é realmente necessário ter consciência das falhas morais da sociedade. Não é preciso nem mesmo sair de casa para contemplar a frivolidade que invade a sanidade de todos, basta abrir alguma rede social e coisas típicas de um consumismo catastrófico irão (pop-up!) explodir na sua cara!
     Desde a Revolução Industrial a humanidade desenvolveu conhecimentos e tecnologias extremamente rápido, e depois da revolução tecno-científica isso ficou ainda mais claro, com a violenta globalização a velocidade de informações se reduziu a segundos e mudou seu endereço de "pontos distântes e distintos" para a onipresença e a onipotência de estar em todos os lugares, hoje, tornando-se onisciência (com a internet) por se solidificar em forma de uma rede que é tecida com informações de diversas partes do mundo que não são emitidas por uma só voz, ou um grupo delas (como a televisão) e sim por várias.
     Acontece que mesmo constando em nossa linha evolutiva um desenvolvimento tecnológico sem precedentes o ser humano parece estar inapto a acompanhar saudavelmente todo esse "superávit" científico, seria adequado, para toda essa sofisticada maquinaria high-tech funcionar de fato, uma compreensão e discernimento do que é realmente necessário e do que é apenas supérfluo, coisa que nunca foi feita, visto que tecnologia como conhecemos é muito recente. O caráter passivo, consumista e fleugmático que a maioria adquiriu é proveniente de uma supravalorização do inerte, uma adoração bombeada através das artérias de um sistema doente. Abdicamos de liberdades e ainda assim vivemos em "Bellum Omnium Contra Omnium" que é nada mais que essa contemporânea competitividade (seja comercial, econômica, cultural, política, estética, existencial...Tudo!) somada à esta confusão de más políticas, crises econômicas e guerras mascaradas.
       Este moralismo poroso em que nos sustentamos, discursos-clichês e ultrapassados, e ideologias não construídas mas sim herdadas (ideias já mastigadas pelos pais) fazem desta geração uma geração de uma maioria desprovida de críticas conquistadas, vivemos então no completo abismo da ignorância em que os ecos são o conformismo. "Capacidade de Adaptação Humana" (essencialmente teórica) deveria ser apenas biológica, não psicológica como a que potencializa o comodismo. Esta capacidade mental de adaptação, mesmo frente a injustiças e atrocidades, fazem de nós uma massa inconstante, só que com o aspecto moralista de um engomadinho reacionário dos anos 50. Estilo de vida um tanto paradoxal, não? Inconstante (ou moralmente inconsistente), porém conservador, moderno, mas tradicionalista.



A fusão de uma até então sólida sociedade pode resultar na perda de valores familiares e emocionais inclusive, caminhamos para o individualismo extremo ou como Marx e Engels mencionam n'O Manifesto do Partido Comunista":
"A burguesia despojou de sua aura todas as atividades até então consideradas com respeito e temor religioso. Transformou o médico, o jurista, o padre, o poeta, o homem de ciência, em assalariados por ela remunerados. A burguesia rasgou o véu da emoção e de sentimentalidade das relações familiares e reduziu-as a mera relação monetária."
   Acrescento, para evitar a generalização, a ausência crítica existe em todos os lugares e ainda paira sobre a maioria, porém há sempre (felizmente) uma parcela da população que torna a questionar. Só para complementar, coloquei um vídeo acima, é interessante, vale a pena assistir! Este faz parte de uma reportagem feita pela Globo News no começo deste ano, é uma análise aprofundada sobre a Crise Européia, envolvendo conceitos como "Sociedade Líquida" do sociólogo Zigmunt Bauman (é, pois é, tô falando dele de novo, não me xinguem) e contando com a palavra de vários economistas [e do próprio Bauman!].
     Mas de onde surgiu tudo isso? Minha crítica seria infundada se eu aqui não expusesse os fatos como eles são. De onde viria então essa propensão anormal à crises? Essa cegueira crônica de analisar a realidade e a mudez de questioná-la? Então um brevíssimo mergulho na história.   
   Tendências capitalistas existiam desde o fim do feudalismo, com a famosa expansão marítima e a profusão do neo-colonialismo essas tendências foram sendo cada vez mais ressaltadas, no entanto, foi no Iluminismo e com a ascensão da burguesia que foram idealizados e/ou retomados (de alguma forma) conceitos como empirismo, universalismo, individualidade e, principalmente, o racionalismo (mesmo este sendo desenvolvido desde renascimento), emanando todo seu caráter científico. A partir deste último foram formuladas novas soluções políticas, educacionais e acadêmicas, foi então se desenvolvendo o chamado Liberalismo, onde era necessário a concessão de um salário ao operário, porém este salário teria de ser o mínimo, tanto para suprir suas necessidades básicas como para o patrão gastar pouco
    Essa ideia foi desenvolvida pelo economista David Ricardo, mesmo este influenciando desde marxistas até liberalistas, este conceito em particular foi de extrema importância para a consolidação do liberalismo. Dentre todos os ideais iluministas o liberalismo mercantil e econômico foi o que mais evoluiu. E muitos "Laissez-faire" depois, desembocamos no século vinte, não com muita sorte, pouco tempo depois enfrentaríamos A Primeira Guerra Mundial.
     Balas, batalhas e bombardeios a parte e então era chegada a hora de recolher os corpos dos campos de batalha e levá-los para os campos-santos, heróis e/ou assassinos (bem, na guerra ninguém deixa de ser criminoso, matar é crime, certo?), cadáveres de ambos os exércitos jaziam no chão. E pouco tempo depois a oficialização do Armistício de Compiégne com bolinhos e balões seria concluída. A sociedade da época era historicamente próxima à revolução industrial e mantinha firmemente a economia tradicional, “firmemente” e “tradicional” também são características da cultura e do pensamento que se estabelecia até então, contudo, a partir deste marco histórico, a economia começa a pesar cada vez mais no que entendemos de “vidas pessoais”. Pouco tempo depois viria “Level II”, a WW II. Lembrando que, às vésperas do início "oficial" da guerra, havia um projeto chamado New Deal, baseado em Square Deal (coisas hereditárias, enfim), o mesmo era um plano que consistia em políticas investidoras que valorizavam obras públicas e um controle maior sobre a produção e seus preços.
      A propensão a guerras no passado é a mesma propensão às grandes crises atuais, claro que antigamente havia muitas crises sazonais, contudo a(s) que hoje presenciamos se arrasta(m) ao longo dos anos e aponta(m) não só problemas econômicos como rompimentos culturais que a força pressionadora da globalização potencializa. É de interesse internacional que haja a globalização para mesmerizar e homogeneizar as nações, com isso não há atrito nem resistência para impedir o êxito dos intuitos de países e organizações imperialistas.

    A globalização é a espada e o escudo do neoliberalismo e do imperialismo, vende-nos uma indulgência dizendo-nos que há paz enquanto a guilhotina pende para que o cidadão se mantenha calado, se ousar, seu senhorio se certificará com prazer de fazer com que não seja ouvido. Contudo, é algo que tem caráter dual, ao passo que une, separa, e ao ser favorável para alguns, é cruel para outros, traz tantos benefícios como malefícios, tanto engloba, como excluí.
                                                             
    
      Voltando à história, é durante e, principalmente, no fim dos bombardeios nazistas que o diáfano e amorfo se torna nítido, blocos econômicos começam a consolidar-se e alastrar-se para reparar as ruínas, eis aí a contradição necessária, manter a pragmática linearidade da inconstância mundial (que se afirma até hoje) para perpetuar o sistema. Frente à destruição são adotadas políticas estatais e assistencialistas onde o Estado conduz social e economicamente em prol do bem-estar da nação, assegura serviços públicos e prestativos enquanto tudo se ajeita para, em breve, recepcionar, novamente, as medidas liberalistas (que nos conduziriam -novamente- às crises).
     Welfare State foi idealizado pelo economista socialista sueco Gunnar Myrdal e desenvolvido em parceria com o liberalista austríaco Friedrich Hayek. Após a II Guerra também observa-se uma maior movimentação no que se entende por "quantificar/tabelar/rotular" as nações, ou melhor, desenvolvidos, subdesenvolvidos, pobres, ricos, comunistas, fedidos, cheirosos, perigosos, etc, e isso de uma maneira muito tênue, com gráficos e planilhas. Me pergunto se é uma espécie de "eugenismo" entre países.
      Em 1958 foi então inaugurada a União Européia, resultado de vários processos anteriores passíveis de tratados e criações de outras organizações como a própria Benelux. Os blocos econômicos então foram se ramificando e enraizando-se nas entranhas do novo mundo, e então estende-se o clássico pós-guerra, American Way Of Life, as freqüências foxtrot nos rádios, sorrisos plásticos e engomadinhos dançantes. A polaridade antagônica de uma novela mexicana desfilava pelo picadeiro mundial, a usual dicotomia, a bipolaridade, clássicos norte-americanos contra soviéticos e se ontem os “inimigos” eram comunistas hoje são as nações do Oriente Médio. Começa a guerra ideológica e a famosa (da qual todos já ouviram falar nas escolas) corrida armamentista.
     No entanto, "mais tóxico e epidêmico que bioterrorismo" é a lavagem cerebral e alguns aprenderam perfeitamente ao ver as crianças nazistas. Estados Unidos da América conseguiram, ao longo dos anos, fazer com que todos os adorassem, derrotaram o cultivo do orgulho nacionalista de países alheios para conseguir disseminar a própria cultura sem empecilhos. E mesmo muitos brasileiros tendo consciência do envolvimento dos norte-americanos em nossa ditadura há ainda uma admiração iludida e ridícula frente USA.     
    Era 1964, os navios estadunidenses estavam ancorados na costa brasileira e o embaixador norte-americano (Lincoln Gordon) enviava cartas à Washington sobre o fornecimento de poderio bélico para o golpe militar. É o ano de 2012 agora, desde o pós-guerra o conflito petrolífero se arrasta, América do Norte autoriza UNSMISS se instalar na Síria, Israel se prontifica para conflito armado, OTAN e ONU intervindo há anos no Afeganistão, construção de bases americanas no Chile (imagem acima), Peru e Colômbia... Não me parece que o mundo mudou tanto assim.
   A transição do pensamento das massas da época noir e vintage para o plano dinâmico atual tem como maior fator diferenciador o desenvolvimento da alta tecnologia. Internet (de fato arma de guerra) e computadores são brilhantes, úteis e reconfortantes, viabilizam a comunicação e a propagação de notícias nas mais variadas visões, no entanto, conjuraram uma hipnose potencialmente manipuladora em pessoas que não usam a internet ou os meios de comunicação disponíveis como forma de aprendizado, informação ou desenvolvimento crítico, cultural e humano. Descartam-se todas as classes e a predominante, independendo de riquezas ou misérias, é a classe da ignorância.  
      "A “globalização” está na ordem do dia; uma palavra da moda que se transforma rapidamente em um lema, uma encantação mágica, uma senha capaz de abrir as portas de todos os mistérios presentes e futuros. Para alguns, “globalização” é o que devemos fazer se quisermos ser felizes; para outros, é a causa da nossa infelicidade. Para todos, porém, “globalização” é o destino irremediável do mundo, um processo irreversível; é também um processo que nos afeta a todos na mesma medida e da mesma maneira. Estamos todos sendo “globalizados” — e isso significa basicamente o mesmo para todos.
     Todas as palavras da moda tendem a um mesmo destino: quanto mais experiências pretendem explicar, mais opacas se tornam. Quanto mais numerosas as verdades ortodoxas que desalojam e superam, mais rápido se tornam cânones inquestionáveis. As práticas humanas que o conceito tentou originalmente captar saem do alcance da vista e são agora os “fatos materiais”, a qualidade do “mundo lá fora” que o termo parece “esclarecer” e que ele invoca para reivindicar sua própria imunidade ao questionamento. A “globalização” não é exceção à regra."
(Citação de 'Globalização: As Consequências Humanas' - Introdução - Zygmunt Bauman)


     Há uma uniformização atual vendida como forma de individualidade e originalidade impulsionada pela tecnologia, o domínio de trustes em diversas amplitudes e a globalização então acaba por excluir muitos. Nesta magnífica "sociedade do espetáculo" não mais valorizamos o "ser", tampouco o "ter" e sim o "parecer"(como diz Debord).
     A inconstância é a efemeridade de nossos anseios que se reflete na instabilidade mundial, é a maleabilidade do pensamento humano, causado, impulsionado e usado como apoio pelos interesses mercantis das grandes corporações, não obstante, tudo isso é pragmático, repetitivo, continuamos caindo nos erros já cometidos, de novo e de novo, em um ciclo interminável.
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Occupy - O Contraponto
    
     Contudo, mesmo com uma espécie de ignorância viral impregnada em muita gente, há um movimento (também viral) chamado Occupy, que estou certa de que você que está lendo já ouviu falar. Occupy em sua tradução óbvia significa "Ocupar" e é a representação viva de que a globalização (resumindo-se, claro, em internet) pode atuar a favor dos direitos e bem comum.
     Certa vez fui a uma exibição de um documentário ("A paz é o caminho") no Conjunto Nacional (Cine Livraria Cultura - 21/05/12) e após o vídeo houve um debate, alguns fizeram perguntas para os idealizadores do filme, outros fizeram apenas comentários, eis então que um homem se levanta para dizer o que pensa, um simples senhor de idade, porém o que me intrigou é que este homem era nativo de Damasco, que eu me lembre, seu nome era Ammar (lembro-me que ele mencionara ser membro em um departamento da Embaixada da República Árabe da Síria, e Ministro da Cultura em Damasco), e claro, precisava de alguém para traduzí-lo, uma mulher ajudou-o a transmitir seus sentimentos.
       Declarou que os protestos locais cujos julgamos não ter repercussão alguma (como aqueles eventuais sob o vão do MASP que só atraem cerca de 20 pessoas) são de extrema importância na verdade, Ammar mencionou que na Síria os que por acaso ficam sabendo de um pequeno protesto no Brasil ou na Argentina interpretam que não estão sozinhos e continuam em sua luta a cada dia, e isso não se aplica apenas a Síria e sim ao mundo inteiro, esta interação simultânea e, de certo modo, solidária é impulsionada, principalmente, pela internet.
        Voltando à Occupy, é sabido que toda sua estrutura se ergue sobre os movimentos árabes do Cairo, as ações em Occupy Wall Street (NY) consistem em reinvidicar direitos e protestar contra a desigualdade, seja a social causada pelo desequilíbrio econômico ou a econômica propriamente dita, produto de falhas da moral humana (ostentação e ganância). A cada dia os protestos na emblemática Wall Street ganham mais adeptos e não só nos EUA, mas também em Londres e, com menor impacto, em São Paulo, com o conhecido AcampaSampa.

Abaixo segue um vídeo (infelizmente no inglês britânico sem legendas) sobre a Occupy London:
Estamos na "Terceira Guerra Mundial" (como diz no vídeo acima) e esta é fundamentalmente baseada na estratégia de dívidas dos bancos internacionais, grandes corporações mantêm como refém a população, imobilizada  pelo inconfundível medo do amanhã ou pelas ataduras dos famosos débitos. Tendo como motivação a indignação ou o desemprego (principalmente em tempos de crise) vemos duas alternativas, a insurreição ou o silêncio.
E, de coração, gosto de pensar que Occupy poderia ser uma espécie de reestruturação para o mundo



      

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